sábado, 16 de dezembro de 2017

HISTÓRIAS QUE INVENTO, HISTÓRIAS QUE ME ACONTECEM


HUMILDADE

Nunca gostei dessa palavra: humildade. Ela nunca me suou bem. E em tempos de hoje: piorou! Tornou-se vulgar. Virou charme ou de gente desonesta, ou de hipócritas que não tem nada a dizer. O jogador de futebol: “eu sou humilde!”; o político: “Gente, eu sou humilde como vocês!”. Os líderes religiosos e sua afetação histriônica: “sejamos humildes!”; enquanto vai condenando quem não for de sua fé. Ou seja, no meu ver: não há palavra mais falsa que humildade.
E Miguel construiu sua casa em cima da laje de seus sogros. Quando casou, ou seja, quando se amigou; pois sua namorada engravidara. Pretendia que fossem morar com seus pais; ele e sua esposa. Estava tudo certo ate que um dia sua esposa flagrou sua sogra mexendo em sua bolsa. Foi algo que lhe cortou o coração. Disse ao seu marido: “Ela suspeitando de mim! Que foi que eu fiz! Assim não da ou você da um jeito ou tudo acabado!”
“Calma meu amor!” dizia ele a mulher para contornar a situação.
“Calma uma porra! Ou Você da um jeito, ou a gente vai morar separado.”
E não havendo outro remédio foi morar com os sogros. Ele é militar. Nasceu no inicio dos anos noventa. Final do século XX; cresceu num período de economia estabilizada, e liberdade de expressão. Herdou do pai seu Manuel: o gosto de ouvir musica em alto volume. Costuma dar farras que vão ate às quatro da manhã; deixando a vizinhança toda acordada. E quem reclamar: é porque não gosta dele. E sente inveja dele: “Sou um homem humilde! Trabalho a semana toda; e nos fim de semana, tenho o direito de botar pra fôder! Quem não gostar que vá pra puta que pariu!”. E ele acha que o Brasil só resolve com uma ditadura. 
Seu Waldir: seu sogro é um homem omisso e subserviente.  Quando jovem pensava em ser artista. Um cantor quem sabe. Ate hoje conserva os cabelos completos; símbolo de seu sonho não realizado. Hoje se contenta apenas a animar bingos. Alguns que ele mesmo elabora em sua rua. Casou-se na marra com dona conceição; um verdadeiro pesadelo em vida real. Do tipo que se acha acima do bem e do mal, pois freqüenta sempre a igreja, mais que todos na vizinhança.  E sempre que se vê “desacatada” digamos assim: sai dona conceição com o seguinte contra-ataque: “Pois, lá onde eu morava, todos me chamavam de doutora! Enquanto aqui vocês querem me passar para trás!”. Naturalmente: ela não entendia a ironia do pessoal de lá de onde ela morava.
E assim se forma o que seria uma família tradicional periférica do século XXI. Nossos personagens aqui citados são somente para ilustra uma maneira de pensar e de agir muito comum nos dias atuais. Ninguém entender o outro, mas, quer que outro lhe baixe a cabeça, se não, não é humilde.
Dona Silvia. Minha vizinha. Por exemplo: mora em baixo de mim. Todo o dia ouve o sermão do padre pelo radio. Mas, quando cruza comigo na rua: vira-me a cara. E quando eu retribuo “a gentileza”, ela diz: “É um orgulhoso! Não sabe ser humilde!”.

José Correia Paz

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